segunda-feira, 29 de junho de 2015

GALINÁCEOS, CASAMENTOS E DIÓGENES

É sabida a preocupação da filosofia em definir o que é o Homem. Platão afirmava que era um bípede implume (isto porque nunca assistiu a um gay pride). Famosa ficou também a resposta de Diógenes que lhe atirou uma galinha depenada para dentro da academia depois de gritar: “Eis o homem de Platão!” Mais tarde foi a vez de Aristóteles colocar a célebre questão de quem teria nascido primeiro: se o ovo se a galinha. E foi assim que os galináceos passaram a povoar a nossa forma de pensar (ou não pensar). É ver o pessoal todo a pôr likes em tudo o que é aforismo de algibeira, como bagos de milho atirado, e ninguém se atreve a nadar contracorrente com medo de ser apelidado de fóbico de alguma coisa, porque o homem é galináceo, não é truta.
Agora foi o facebook que se engalanou de arco íris e é ver os meus amigos de todas as cores. Como Aristóteles, têm uma preocupação em arrumar tudo muito direitinho nas gavetas apropriadas, porque isso lhes confere respeitabilidade. E assim, tudo arrumadinho, homossexuais para um lado, héteros para o outro, não há confusão possível não vá o diabo tecê-las e chamarem-me nomes de que não gosto, como se o Homem não fosse macho e fêmea com possibilidade infinitas de procurar e encontrar prazer, uns dias comendo figos e outros dias bananas. Nada de confusões. A respeitabilidade é linda e ficou tudo encantado porque o Supremo Tribunal do Estado mais poderoso do mundo disse: sim senhor, os homens e as mulheres podem casar. Quer dizer, uns com os outros. Que raio, estou a fazer uma confusão dos diabos: Os homens com os homens, as mulheres com as mulheres, como já faziam (já quase não fazem) os homens com as mulheres e vice-versa. Tudo arrumadinho e respeitável que é para não andarem para aí a fazerem porcarias uns com os outros às molhadas. Dizem que foi pelo direito à felicidade. E eu a pensar que o homem e a mulher se casavam porque preferiam ser infelizes acompanhados, que felizes solitários. Mas pronto, pode ser que tenham encontrado a fórmula com a bênção do Estado que passa a conferir carta de alforria aos afectos de cada um. Mas lá dizia o meu amigo Diógenes, outro grego, o da galinha depenada, lembram-se? “Idade para casar? Nunca quando ainda se é jovem, nunca quando se já é velho”.
Dizem que é para imitar os gregos (está na moda) que a sabiam toda. Mas os homens gregos, tirando o caso de Aristóteles que tinha obsessão por gavetas, casavam com mulheres gregas para lhes fazerem os filhos, e iam para o deboche com os outros homens, e nunca lhes passou pela cabeça estragar tal felicidade com essa coisa de papel passado. Mas os gregos não tinham vergonha da sua ambivalência, como agora que se quer tudo arrumadinho no seu canto.
Sossegaram os meus amigos que gostam de futebol, homens suados a correr, mostrando os músculos bem definidos, tudo nu nos balneários, uma festa, e assim disfarçam o que não se pode confessar e podem pôr o arco-íris à vontade porque são muito machos e agora, com isto do casamento, já não há perigo de confusões. Têm orgulho de ter amigos gays, como amigos negros (e eu fico sem saber o que dizer, porque nunca olho para a cor dos amigos e muito menos para o sexo). E quem não gosta é homofóbico e assim toca a pôr um like que é para não me chamarem nomes, e lá vão os galináceos todos contentes com a raposa a guiar-lhes o caminho.
Vai um tipo muito sossegado, com o amigo de infância, depois de um jogo em que o Benfica ganhou, bebem umas bejecas, o gajedo desaparece, porque estão bêbados, e de manhã acordam um ao lado do outro. Antigamente desculpavam-se com os copos, não se fala mais nisso, não dei por nada, não faço ideia do que aconteceu, olha não sei como foi contigo, mas eu não achei piada nenhuma… Agora, diz um para o outro: tens de divorciar-te da Maria e casamos… fosga-se! Dizem que é pela felicidade?! Tá tudo doido.
Mas pronto, casa-se tudo que brincar sozinho é que não vale que é uma grande porcaria que só o Diógenes (lá está ele de novo) é que o fazia para depois dizer: “quem me dera poder saciar também a fome esfregando apenas a barriga!”
            Sejam felizes.


sábado, 20 de junho de 2015

A PINTA DOS POLÍTICOS, E O QUE LHES FALTA


Ouvi há dias na televisão o Dr. João Soares afirmar que os líderes da Grécia, ministro das finanças e primeiro ministro, eram “tipos com muito boa pinta”, pelo que não percebia porque raio os líderes europeus e o FMI, que, ao contrário, têm tão má pinta (como afirmou), não lhes faziam a vontade. Ouvindo tão preclaras interrogações do Dr. Soares (jr.) julguei perceber a razão por que Cristina Lagarde gasta tanto dinheiro nos trapos e nas joias que usa: esconder a má pinta que tem. Lamentamos todos, nós e os gregos, que a Srª FMI não partilhe do gosto estético do João e não se renda à boa pinta do Varoufakis. Outros gostos…!

Sabemos todos que os nossos políticos andam preocupados com a desertificação do país, não só pela fuga dos jovens, mas também pelos baixos índices de natalidade. No meio de uma reunião em que esta preocupação se discutia, ouvi um autarca afirmar que na sua terra ainda não se sentia essa falta de crianças ao contrário do que se passava noutras terras da região. Achava ele que isso se devia ao facto de os seus conterrâneos irem pouco à missa, não perdendo assim o tempo precioso para fazer filhos.
Afinal é tudo culpa dos gregos que inventaram Chronos, pensei eu com os meus botões, e dei por mim a lembrar a pobre rainha Maria II, que entre a missa diária, as tricas com o Saldanha, as revoltas da Maria da Fonte e Patuleias, a educação dos filhos, as idas à tourada e o incêndio do palácio de Barcelos, conseguiu, no espaço de vinte anos, parir onze filhos enquanto punha o país na ordem. A dificuldade dos seus partos e a obesidade que lhe arruinava o coração e lhe estragava a pinta, obrigou os médicos a aconselhar repouso. A rainha respondia-lhes que se morresse, morria no seu posto (morreu de parto), deixando-nos a todos intrigados se posto significava o trono ou os lençóis, e com suspeitas sobre as causas do incêndio do palácio de Barcelos onde ela e o rei consorte… dormiam.
Maria II tinha o que não têm os políticos de agora. Foi uma excelente negociadora que conseguiu pôr ordem numa casa que encontrou de pantanas, e fez filhos. Percebi assim que, ao contrário do que aquele eminente autarca e os médicos pensam, fazer filhos não é uma questão de tempo, tal como a boa pinta nada tem a ver com finanças e negociações, como julga o Dr. João Soares… É tudo uma questão de tesão! Que não faltando ao povo falta aos políticos que não conseguem criar condições de esperança.


(para os sensíveis: tesão; do latim tensio que significa rijeza)


Imagem (peço desculpa pela má qualidade): imperador Carlos Magno, pai da Europa e de vinte filhos conhecidos. Ia à missa e obrigou os alemães a fazer o mesmo.

quarta-feira, 17 de junho de 2015

A NOVA INQUISIÇÃO


É voz comum, disparatada mas comum, que a Igreja, através da inquisição, condenou Galileu por heresia mantendo assim um combate constante contra a ciência. Quem assim pensa não faz a mínima ideia do papel da Igreja no ensino da Ciência e do facto de Galileu nunca ter sido considerado herético (não tendo sido torturado e muito menos condenado à morte). Galileu defendeu uma teoria que já existia mas que só era permitida como hipótese para os astrónomos fazerem os seus cálculos, e que ia contra o sistema aristotélico defendido pelos sábios universitários. Ora a Igreja era quem mandava nas universidades e as invejas dos sábios universitários foram mais fortes que a amizade do Papa Urbano VIII pelo famoso matemático e astrónomo. Galileu era arrogante e desbocado, chegando a dizer algumas tolices como a de que a prova que a Terra se movia era o facto de haver marés, chamando idiotas aos que defendiam o efeito da Lua. Mas Galileu era um grande cientista e tinha razão, apesar do disparate das marés. Não obstante perdeu a carreira e foi mesmo condenado à prisão, que se transformou em domiciliária, sem pulseira, por pressão dos seus amigos, o arcebispo de Siena e o Grão Duque da Toscana, na sua residência da Vila do Gioiello, em Florença.
Com o caso de Galileu encerrado, a inquisição extinta, e as universidades tornadas laicas, julgámos nós, gente do senso comum, que a liberdade de expressão permitiria a qualquer cientista dizer os disparates e as idiotices que quisesse, desde que isso não pusesse em causa o seu raciocínio científico. Não é assim. Vivemos sob o escrutínio do politicamente correcto, e tal como na Renascença, em que não era permitido contradizer Aristóteles ou os Padres da Igreja, não podemos emitir opinião contrária à defesa das chamadas causas fracturantes, mesmo que isso não interfira com o nosso juízo científico. Somos todos Charlie, mas estamos longe de sermos Tim.
Sir Tim Hunt, cientista com Nobel a atestar a sua qualidade, teve de abandonar a sua carreira por confessar publicamente que se apaixonava pelas cientistas com quem trabalhava e afirmar que o choro é também uma característica feminina, demonstrando à saciedade não perceber nada de mulheres. Foi condenado, não por ser mau cientista, mas por ser um idiota pinga amor. Ao contrário de Galileu, não teve direito, sequer, a julgamento.
Voltando a Galileu, tenho a certeza que o famoso astrónomo seria de novo condenado pelos modernos familiares do Santo Ofício que zelam pela correcção da linguagem e do pensamento. É que afirmar que a Terra gira em volta do Sol, é um axioma absolutamente machista e contrário ao compromisso que a Universidade tem com a igualdade de género. Em vez do sussurro: E pur si muove, ouviríamos, e pur si muovono insieme
Sabem o que vos digo? Vou até ali à esplanada, beber umas bejecas e apreciar o movimento das pernas da outra metade da humanidade, imaginando-me um Sol heliocêntricamente instalado. A frase é redundante, eu sei, mas que se dane.

segunda-feira, 8 de junho de 2015

QUANDO O KEN É O HERÓI, O MUNDO É O QUÊ?


Fernando, o nosso santo António que agora celebramos, e Francisco eram jovens na casa dos vinte anos quando, cheios de coragem, confrontaram a família, o mundo em que viviam e os inimigos que os ameaçavam com o martírio, porque acreditavam que era possível um mundo mais justo e solidário. Marcaram indelevelmente a consciência da Europa e foram o modelo para muitos outros jovens. O nosso tão apregoado Estado Social deve muito, senão tudo, a estes jovens corajosos.
No meu tempo de menino, marcado já por outros valores, maravilhei-me com o Tarzan, esse herói nietzscheano. Era um cromo da banda desenhada mas não deixava de ser a popularização do Übermensch, o Homem que vai além de si mesmo, o Super-Homem, como pregava o filósofo alemão que ainda não conhecia. E depois havia o fascínio erótico que o bom selvagem, que não obedece a nenhuma lei senão à sua própria, exerce sobre as mulheres, ou assim pensam os rapazes. Se no meu tempo seria ridículo vestirmo-nos de burel (os hippies são uma tentativa absolutamente falhada do anti-herói franciscano), já aparecer na praia de sunga à tarzan era perfeitamente justificável e compreensível. Mais tarde salvei-me por outra figura de herói, também com traços nietzscheanos: Alexandre, o Magno, mas nunca perdi de vista Francisco e António, escondidos no meu esquerdismo mal assumido.
Para se igualarem ao Tarzan ou aos seus jogadores preferidos, os jovens perdiam (ou ganhavam) o tempo em exercícios de musculação ou jogando à bola, e isso só lhes beneficiava a saúde. Quando um jovem se submete a sucessivas cirurgias, prejudiciais para a saúde, para se tornar parecido com o seu herói: o Ken da Barbie, não deixa de mostrar alguma coragem, mas o sinal que lança sobre o rumo da nossa sociedade é assustador: o Ken é um boneco cujo único objectivo é acompanhar a Barbie. Um companheiro casto, ainda por cima. Não por opção como Francisco e António, mas por falta de atributos, o que no imaginário de qualquer homem lhe retira a coragem por não os ter no sítio.
Um jovem aprende e cresce em luta com o mundo e com os pais, como Francisco e António, mas CelsoSantebañes teve o apoio de pais e cirurgiões para o seu delírio. Tinha quase a idade de Francisco e António mas nunca cresceria. Morreu devido a uma leucemia linfoide e a uma pneumonia bacteriana, que se não foram consequência das cirurgias, também não ajudaram nada, pelo contrário. É demasiado estranho para compreender. E é tão triste que guardo-me de dizer o que penso sobre os pais e cirurgiões.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

NOVA ARMA GEOESTRATÉGICA


O mundo espantou-se quando no passado dia 27 de maio foram detidos alguns membros da FIFA à beira da sua reunião anual, acusados de corrupção.
Dizer que o mundo se espantou é força de expressão. Já ninguém se espanta com corrupções no futebol, mas o facto é que eu, que ao contrário de Sá de Miranda já não me espanto (mas ainda me envergonho), fiquei tomado de espanto ao ver esses baluartes da luta contra a corrupção, EUA e Suíça, juntarem-se para prender os prevaricadores. Depois foi um instante até que Mr. Blatter se demitisse apesar de recém eleito.
Estranha-se esta Suíça moralista, cuja obsessão pela limpeza os cega à sujidade do dinheiro que lhes entra pelos bancos e que é causa da sua prosperidade, e estranha-se os EUA preocupados com a transparência no futebol, esquecendo o basebol. À primeira vista é louvável que se combata assim a corrupção mas como com a idade me vou tornando mais cínico, penso com os meus botões que me espanto por nada.
Um dia antes destes acontecimentos um jornal americano fazia publicar as declarações do senador McCain que exigia que a FIFA substituísse o Sr. Blatter por outro presidente que revogasse a decisão de fazer o Mundial de Futebol de 2018 na Rússia. McCain é aquele senhor que há tempos exigia que os EUA fornecessem armas de topo aos “combatentes da liberdade” na Síria e que hoje tomam o nome de ISIS, ou estado islâmico. Seria hoje presidente se Obama tivesse perdido. Agora lança-se numa cruzada contra a FIFA em defesa da democrática e incorrupta Ucrânia submetida às garras da Rússia de Putin.
Perceberam agora? Nada mudou. O mundo continua sereno e tranquilo. Nem os EUA nem a Suíça vão agora pôr-se a combater a corrupção, era o que mais faltava. Podem os bancos e os detentores das grandes fortunas suspirar de alívio.
É só futebol: a nova arma da política geoestratégica americana!