Um estudante Sul-africano
a estudar leis em Oxford ofendeu-se com a estátua do antigo estudante de Oxford,
Cecil Rhodes, tendo encabeçado um protesto para o derrube da mesma. Diz ele que
Cecil Rhodes representa o imperialismo, o colonialismo e o roubo das riquezas
de África.
Que um estudante de um
país com universidades com mais de cem anos vá estudar para Oxford que foi o símbolo
do imperialismo britânico, e se ofenda com a estátua de um dos seus alunos que
tanto deu para a glória desse império, é algo que me surpreende. O estudante,
em coerência, devia abster-se de pisar os relvados e as margens do Tamisa. É que
se Cecil Rhodes era um sacana, era o sacana dos britânicos e o estudante Sul-africano
deveria preocupar-se com os seus próprios sacanas.
Rhodes, um maçon
imagine-se, era um homem do seu tempo e partilhava das mesmas ideias que
inundavam os corredores das faculdades à beira do Tamisa: de que os ingleses
eram uma raça superior e que Deus tinha o desígnio de eles se espalharem pelo
mundo a fim de o melhorarem. Se cumprindo esse desígnio enriqueciam, isso era
considerado a justa paga pelo seu esforço em prol da humanidade. Rhodes amou África
e teve razões para isso. Foi lá que enriqueceu. Mas também deixou os
fundamentos de um estado moderno, onde imperariam o desenvolvimento, a justiça
e a democracia. Coisa que entretanto desapareceu sem que o jovem estudante Sul-africano
se tenha preocupado. Ficou sepultado junto dos reis negros da zona e as tribos
indígenas homenagearam-no como se fosse um deles.
Os reis tribais com
quem Rhodes negociou, guerreou e oprimiu também acreditavam em desígnios de
Deus e dos seus Antepassados. Para os conhecer sacrificavam àqueles, matando
jovens para os agradar (sem homens como Rhodes o que teria acontecido ao jovem
estudante Sul-africano?). Para testar a coragem dos jovens iniciados,
obrigavam-nos a rituais antropofágicos. Podemos criticá-los? Devemos cuspir nos
seus túmulos? Julgo que não. Agiam de acordo com as suas crenças e hábitos, tal
como Rhodes que apesar da sua arrogância sempre afirmou que não desqualificaria
ninguém por causa da cor da sua pele.
O seu pensamento era o
da época, no entanto Mark Twain achou que merecia a forca quando afirmou: “Admiro-o
muito, confesso com franqueza; tanto que quando a sua hora chegar comprarei um
pedaço da corda para recordação”. Pena não haver um escritor africano que tivesse
dito o mesmo dos sanguinários potentados africanos do século XIX.
O estudante Sul-africano
de Oxford, ao esquecer a cleptocracia que hoje governa África, lembrando a
riqueza de Rhodes está só a afirmar o seu arrogante racismo: de que só os negros
podem roubar em África.
Mas o nosso fardo
continua. Em Roma cobriram as estátuas gregas e romanas do museu capitolino
para não ofender o olhar puro e virgem do presidente do Irão. Tendo em conta a
pouca vergonha que impera em Roma (desde que vi aquela Madalena de seio nu
junto ao corpo de Cristo na esperança da sua Ressurreição, nunca mais fui o
mesmo), julgo que as autoridades romanas, na próxima visita de um homem de
estado muçulmano, deverão cobrir a cidade inteira com um enorme lençol branco. Que
não fique nada de fora desde São Paulo extra muros até à piazza del Popolo, de São João de Latrão ao Vaticano. Sobretudo o Vaticano. Depois
recebam o homem nas catacumbas de São Calixto, de preferência às escuras, não vá
haver nas paredes tumulares algum fresco menos próprio.