domingo, 6 de março de 2016

HENRIQUE RAPOSO E RAQUEL VARELA: O DIREITO AO DISPARATE


Henrique Raposo é um historiador “amestrado” em Ciências Políticas (a piada não é minha mas vem assim escrito no site da empresa que lhe vende os livros). É também cronista em jornais e revistas, mantendo uma crónica semanal no Expresso, sendo esta a qualidade que o torna conhecido. Escreveu um livro onde conta coisas do seu Alentejo, ao que parece no mesmo tom com que escreve as crónicas: provocador. Como toda a gente sabe o Alentejo é aquela zona do país que foi adoptada pela burguesia como ersatz de um campo que nunca vivenciou. Tal como os adoçantes substituem o açúcar sem engordar, o Alentejo permite que os burgueses da capital sujem as botas com a lama que salpica dos jeeps, evitando assim o cheiro do chiqueiro dos porcos que nunca conheceram. O Alentejo vinga-se tornando-se hoje na zona do país onde se pode comer e beber a preços semelhantes aos dos boulevards de Paris, sem que a qualidade corresponda sempre ao preço exorbitante. Por isso o Henrique Raposo, apesar de alentejano, não podia meter-se com o Alentejo. Caiu o Carmo e a Trindade e já quiseram proibir-lhe o livro. Parece que diz muitos disparates, tal como o Orçamento do Estado deste governo e de todos os governos que o antecederam. Diz ele que as alentejanas deixam-se violar por desconhecerem termo em português que defina o acto e acrescenta que os alentejanos se suicidam muito por causa de coisas que não correspondem à verdade no parecer dos especialistas. Isto, é claro, foi o que eu ouvi dizer porque, à semelhança dos que querem proibir-lhe o livro, não o li nem faço tenção de o ler.
Raquel Varela, que é tão inteligente como bonita, isto é: muito, licenciou-se em Direito e fez pós graduações em História, dedicando-se à investigação dos fenómenos sociais. Do alto da sua cátedra, no programa da RTP3: “O Último Apaga a Luz”, desancou no Henrique Raposo, que deve estar habituado pois há muito que é o saco de boxe da Esquerda pensante do país. Afirmou que o senhor só dizia disparates mas que lhe reconhecia o direito de os dizer e, por isso, era contra qualquer tipo de censura. Afirmou que quer as mulheres do Norte quer as do Sul nunca falam em violação porque dizem “aquilo”, e quem não sabe disto é tolo. Eu acho que Raquel Varela tem razão (entre o Henrique Raposo e a Raquel Varela eu escolho sempre a Raquel), mas escusava, para fazer valer o direito ao disparate, de afirmar disparates. Que diabo, que um cronista de jornais diga disparates, a gente percebe, mas que a Professora Titular Visitante da Universidade Federal Fluminense faça análise social sem se desligar dos seus preconceitos ideológicos e anti-religiosos, para além de disparatado é pouco científico. Ainda às voltas com o levantamento popular generalizado dos colonizados nas ex-colónias que a Professora diz ter havido sem que nós, os colonos, tenhamos dado por isso, ouvi agora na TV, a professora dizer que o Alentejo tem muitas razões para explicar os numerosos suicídios, e adiantou um: O Alentejo é mais pagão (sic), muito por influência (no pensar dela) das raízes islâmicas, pelo que a Igreja não impôs ali o medo do pecado e assim, os alentejanos podiam, sem culpa, suicidar-se, ao contrário dos do Norte que se arrastavam pela vida sem lhe pôr termo com medo das penas do Inferno (desconheço se Raquel Varela alguma vez leu Torga que escreveu sobre o “abafador” que as gentes do norte usavam como eutanásia). Eu, que não sou do norte nem do sul, mas do XXXsul, sempre adianto que quer a imensidão da planície quer a pequenez do vale entre serras me aumentam a pulsão suicida. Por isso prefiro o mar ficando a aguardar que Raquel Varela me explique porquê.
Ora sendo o Islão, tal como o Judaísmo, a religião que mais combateu e combate o paganismo, acusando mesmo os católicos, fazendo coro com judeus e protestantes, de contemporizarem em demasia com o paganismo, daí o culto das imagens, há de a professora Raquel Varela explicar como foi que o Alentejo ficou pagão. E há de explicar ainda, sendo o Norte tão católico, por que razão associamos a Galiza, Minho e Trá-os-Montes a bruxas, aos maus-olhados e aos responsos, trazendo ao de cima todo o paganismo celta mal apagado pelo fervor inquisitorial católico. Confunde Raquel Varela descrença com paganismo, o que é um disparate pois não há nada mais religioso que o paganismo.
O Alentejo não é muito religioso, parece ser um facto (não sou especialista) mas é por isso que não pode ser pagão, porque é descrente. Raquel Varela, tal como Henrique Raposo, tem o direito ao disparate. Como Professora não tem o direito de colocar a ciência de lado para fazer valer o preconceito ideológico que a toma por inteiro. Pode errar mas não pode disparatar.

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